Pesquisa etnográfica e autoetnográfica secretarial



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Nota de abertura: este texto é um extrato do artigo Fases do processo de pesquisa secretarial: a questão da tipologia, originalmente publicado neste blog.

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Pesquisa etnográfica e autoetnográfica secretarial

A pesquisa etnográfica visa compreender, na sua cotidianidade, os processos do dia-a-dia em suas diversas modalidades. Trata-se de um mergulho no microssocial, olhado com uma lente de aumento. Aplica métodos e técnicas compatíveis com a abordagem qualitativa. Utiliza-se do método etnográfico, descritivo por excelência (SEVERINO, 2007, p. 119).

Nesse sentido, a pesquisa etnográfica busca conhecer os processos humanos realizados cotidianamente em um recorte específico, para o nosso caso: no secretariado. A pesquisa etnográfica secretarial refere-se à descrição de práticas e rotinas, pessoais e profissionais, de secretárias e secretários em seu locus de trabalho. 

Em contraponto ao estudo de caso, método que eu já defendi aqui em meu blog, no texto Por uma metodologia aplicada à construção do conhecimento secretarial, como sendo o mais adequado para o caso do secretariado, a etnografia enquanto método apresenta um grande caráter ético e humano do pesquisador, considerando o outro não só como objeto de pesquisa, mas como sujeitos. Nesse aspecto, os elos humanos são estabelecidos como escolha política metodológica, em que não há hierarquia entre pesquisador e pesquisado, mas uma contribuição mútua para a evolução do conhecimento humano.

Uma questão que vem a tona, considerando especialmente as epistemologias do sul, abordagem proposta pelo professor Boaventura de Souza Santos, que considera a ruptura de modelos teóricos e metodológicos que pouco conversam com a realidade latinoamericana, é o fato de, por diversas vezes, o pesquisador secretarial ser também profissional de secretariado. Sendo assim, é possível estabelecer um método que inclua o sujeito pesquisador também como sujeito pesquisado, falamos então da autoetnografia secretarial.

A autoetnografia reside na análise descritiva das práticas profissionais do próprio pesquisador. Ela ainda pode ser utilizada junto ao método etnográfico, em um modelo comparativo, buscando compreender e analisar elos de conexão entre as práticas e rotinas descritas. 

As pesquisas autoetnográficas são naturalmente de campo, ainda que falemos de uma autoanálise; e é comum que o pesquisador se coloque como narrador da história, em primeira pessoa ou criando um personagem fictício para cativar e envolver o seu leitor.

Do ponto de vista da narrativa formal, os autoetnógrafos muitas vezes escrevem usando a voz na primeira pessoa, ou seja, posicionando-se como narrador da história. O ponto de vista da primeira pessoa é decididamente subjetivo, porque o narrador relata o que ele ou ela observa (ou observou), as experiências, os saberes e o sentimento que fornece aos leitores sobre seus relatos enquanto uma testemunha ocular do fato vivido (SANTOS, 2017, p. 232).

Inicialmente, o principal cuidado que o pesquisador precisa ter é na delimitação do perfil dos sujeitos envolvidos. Se eu for secretário executivo em uma instituição de ensino, o ideal é analisar etnograficamente profissionais que atuam na mesma modalidade de instituição, quando eu quiser fazer uma análise comparada com as minhas práticas e rotinas profissionais.

O segundo ponto de atenção no método autoetnográfico é na escolha de um elo de conexão de análise, ou seja, um segundo ponto focal que servirá como aporte para as análises, ainda mais quando não houver outros sujeitos envolvidos na pesquisa além do próprio pesquisador. É preciso um aporte teórico bem delimitado, considerando o autoperfil que será analisado. Esse elo pode ser constituído, no caso do secretariado, por artigos especializados, pelas diretrizes curriculares nacionais para os cursos de bacharelado em secretariado, pelo perfil do egresso estabelecido nos catálogos de cursos técnicos e tecnológicos e pelo perfil do profissional de secretariado estabelecido na Lei de Regulamentação da Profissão, nº 7377/1985.

Pesquisa participante e pesquisa-ação no contexto da autoetnografia secretarial


A pesquisa autoetnográfica pode ser desenvolvida na vertente participante ou pesquisa-ação: 1) quando pesquiso um grupo em que estou inserido, como, por exemplo, as práticas do setor em que atuo profissionalmente; 2) quando, por meio da pesquisa e dos dados obtidos nela, proponho uma intervenção nas práticas profissionais do grupo que integro. No primeiro caso, temos a pesquisa participante autoetnográfica; no segundo, a pesquisa-ação autoetnográfica.


Nesse sentido, o pesquisador, diferente das abordagens iniciais de pesquisa participante e pesquisa-ação, em que ele se insere no ambiente para melhor compreendê-lo, na autoetnografia, ele é parte do grupo, está diretamente integrado a ela.


Leitura complementar:

DEMO, Pedro. Pesquisa participante: saber pensar e intervir juntos. Brasília: Líber Livro, 2004.

PEIRANO, Marisa. A favor da etnografia. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 1994.
SANTOS, Silvio Matheus Alves. O método da autoetnografia na pesquisa sociológica: atores, perspectivas e desafios. In: PLURAL, Revista do Programa de Pós‑Graduação em Sociologia da USP, São Paulo, v.24.1, 2017, p.214-241.

THIOLLENT, Michel. Metodologia da pesquisa-ação. São Paulo: Cortez, 2005.


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Como citar este texto no seu trabalho acadêmico:

MOURA, Jefferson Sampaio de. Pesquisa etnográfica e autoetnográfica secretarial. Blog Um Sampaio, 2022. Disponível em <inserir link> . Acesso em XX mês de ano.


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